República do Pensamento

PARA NÃO FALAR SOZINHO

Nada mais humano do que encarar os limites. Nada mais humano do que vencer perdendo. Nada mais humano do que perder vencendo. Nada mais humano do que comer quieto e ser bicudo. Quando escrevo, meto o bedelho onde não sou chamado. Quando leio, viajo sem destino certo. Escreler e transar: tudo vale a pena para o trânsito não engarrafar. Alma é trânsito livre. Corpo é movimento intensamente variado. Variado de idéias ou variado das idéias, sigo atento à parada do fracasso que não toca na rádio, mas que me toca muito. Palavra é uma verdadeira operação tapa-buraco. Onde se encontra um arranjo de orações? Nos achados e perdidos? Como não se admirar pela constelação de frases que ouvi de um menino de rua hospedado em um conhecido hotel de mil estrelas? Por que uma seqüência de palavras cura? Na sede eterna de ocupar o silêncio está a língua cheia de tesão semântico. Ela cerca o besouro íntimo dos signos, que está dentro de uma caixa. Despachada a caixa e engolido o besouro, ele desce garganta a dentro, inquieto como uma ostra se debatendo ao ser tocada por gotas de limão. Pede-se a paciência dos bois para digerir o plasma daquela criatura malcriada. O som da digestão embaralha as cartas guardadas na manga verde do maduro jogador. Ele caiu da árvore e se espatifou como aquele ovo que pariu a gema sem consulta prévia da casca. Pisar devagar para não acordar o ruído está no código de transe das palavras. Tese: o medo é a aceleração da gravidade. Vencer a gravidade é a busca de quem tem fome. A estética da fome versus A fome da estética : brasilidando. A maça de Newton foi proibida no paraíso. Pode um negócio destes? A gente peca por não pecar, caros amigos. Há que se medir a taxa de mortalidade dos sonhos.

Ruim é também estar com a cueca de ontem. Visite uma exposição de rachaduras. O futuro virou um depósito de idéias otimistas. Morder rindo para não viver chorando. Anjo com a asa quebrada não achou vaga no SUS. SUS SOS SUS. Ladrão bom só existe um: é ladrão de beijo. Dó ré não me faz assim. Samba do logaritmo: um dizer, telecoteco; dois entenderes, ziriguidum; três saberes, balacobaco. Permitida a entrada de pessoas estranhas. A superfície é profunda. Quem quiser segurar a dor que segure. Sou pelo prazer. Afinal, esse mundo é gozado.

* Marcos Fabrício