República do Pensamento

ATO DE ATOR
Para Cristiane Cândido

Assumidamente finjo.
Tomo emprestado outro ser
para fazer de mim
uma pessoa que não sou,
mas que acabo sendo
por me cansar de ser um peixe fora d'água
vinte e quatro horas por dia.
Quero vida fora do aquário.
O palco gira em torno do respeitável público.
Pego carona naquela nave megaespacial
e giro enquanto interpreto com o meu corpo
a alma dos outros.
Sou um atravessador de influências,
profissionalmente um amador
que oferece suor ao texto decorado
em troca de sangue alheio.
Sou vampiro ao possuir seu pescoço.
Ânsia de fazer uma voz tão parecida com a sua.
Você fala pra mim,
e eu sequestro o seu timbre
a fim de falar por você
o que só você quer de mim.
Quando eu me adentro em seu terreno oculto,
explicitamente sou o personagem preferido
do papel que eu mesmo faço
na condição de ator do estranho que me habita.
Familiar é ser tanto os outros
que ando em busca de mim
no compasso das vaias e dos aplausos
que me avaliam na missão de sair de mim
para visitar aquele que me espera com fome de identidade.

* Marcos Fabrício