República do Pensamento

ROCK IN ROLLO


Hoje me sinto um maridão feliz.

Realizei a fantasia da minha honey baby.

Acordei cedo,

comprei o pão,

trouxe o leite,

preparei o café,

reguei as plantas,

levei o rex pra passear,

beijei a sogra dos outros...

Com o dinheiro contado,

nem olhei para o bar...

Paguei as contas,

como manda o figurino.

De volta pra casa,

lavei a louça,

não deixei rastros de gordura no fogão,

varri a casa,

fiz as pazes com o espanador,

peguei o rôdo e dei cavalinhos de pau pela casa toda,

torcia o pano de chão como se torcesse pela argentina.

tudo brilhando para as duas estrelas brilharem...

e quando minha amada viu tudo aquilo,

fez a declaração mais linda que eu já ouvi:

amor, você está lindo de avental!

De imediato, peguei a vassoura

e fiz um solo de guitarra muito especial.

De cadeira cativa,

minha amada curtia o rock in rollo

que compus em tributo às rugas, às estrias e à barriguinha de chopp.

Ela beijou minhas mãos batizadas pelo detergente da faxina.

Olhando para a luz dos olhos meus,

perguntou se eu não estava com febre.

Diante daquela súbita polissemia da questão:

preocupação ou ironia?

Optei pela terceira via. Logo, respondi:

Só se for febre de amor, querida!

Minha saúde é de ferro,

do mesmo ferro que passei

o nosso traje de gala para esta noite:

a sua camisola azul-pampulha e o meu pijama verde-mineirão.

Extasiada, ao entrar no lugar de tantas cagadas feitas,

Ela ficou impressionada com a revolução olfativa do ambiente:

o vaso sanitário foi promovido a vaso de flores.

Estilo meio duchamp, meio shampoo.

Tudo estava arrumado

pronto para desarrumar de novo.

Ela me puxou pelo aventual.

Confesso que perdi o juízo.

Arranquei-lhe a bolsa como um pivete.

Lucro é quando vale a pena o prejuízo.

E assim fomos cirandar. E cirandamos.

A casa se abriu para a rua,

e a rua pela casa resolveu ficar.


* Marcos Fabrício