BICUDO
Esta oração quer varar a madrugada
Guia de girassóis vagabundos
A lua testemunha meu andar bêbado
No caracol do mundo
Cala boca minha gula
Tenho fome da tua atenção
Sinal amarelo que antes se esverdeava
Ao me ver passar cantando pneu
Este copo é para pôr teus olhos baby
De conversafiada em conversafiada
Vou amolando o mundo
E o mundo me amola
Sou faca amolada
Que nada crava
Pois não quero ser flor em velório
Quero aproveitar a vida
Como se fosse um adolescente
Que relincha feito égua
Nos ovários do sol
Sempre obedeço minhas taras
Em vidas passadas
Aprendi que é lamentável ser vício para um ciclone
Se preciso rasgo as pregas da boca
Com os pregos de tua indiferença
Estranho é que não me surpreendo
Lixo nesta redundância
Onde ódio e prazer caminham juntos
Amamento o vento
para que possa parir brisas
Canhoto são meus modos
Esqueço lembranças que resistem na gaveta
Surdo por tanto ouvir os vitoriosos
Sou boneco de Olinda jogado no mangue
Um embriagado apelo de impossível
Amanheço nos olhos ressaquiados de um cachorro
Atiro rosas em minha própria sombra
Desconfio da fofoqueira luz
Que dá notícia de tudo
Minha pele é suja de pirâmide
No segredo há sede
Falo franco sem algemas na palavra
Inseticida nenhum mata mosca socrática
O princípio está na ignorância ao contrário
É tanto carrapto num só cachorro
Digo além e você entende amém
Me sinto cigano no apartamento de sempre
Dentro do locomotivo passo como salafrário das letras
Faço um brinde especial
A quem assumiu
Que peidou no elevador lotado
Sou distância carro de boi ainda
Também me entrego como se fosse resto ao instante
Brinco com as flores da memória
Simplesmente ouvindo a imaginação
Invento pois finjo com classe
Sem classe a verdade nua e crua é brochante
Aterrizo mas não bóio
Minha cara é um cometa
Sepulto a tristeza no baú da luminosa orgia
A remela em teu semblante é o meu bom-dia preferido
* Marcos Fabrício
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