República do Pensamento

Há um lado flor em mim
O jardineiro não é responsável
Meus espinhos não param de crescer
Há um lado folha caída em mim
Louca para voltar a viver
Mas tem que feder
Para poder renascer


Há um lado cisne em mim
Querendo pousar de pavão
Para a próxima capa de revista


Há um lado urubu em mim
que come carniça
que come da fruta
sem dispensar o caroço


Se sou frio
Que seja para manter a cerveja gelada
Se sou quente
Que seja para incendiar uma gata


Há um lado em mim que é surdo
Jogo bola com a parede
Numa tabelinha enfadonha
Conto para a fronha
Que o meu travesseiro é tarado


Um lado inteligente em mim
Cata agulha em palheiro
Xinga o dicionário de pai dos burros


Minha boca voa como borboleta
Que quer pousar na ponta do seu nariz
Ou cochichar em seus ouvidos
Um segredo de Estado


Um animal em mim
late mia relincha
A razão ganha um coice
A emoção, um uivo


Há um lado comercial em mim
Que soa moeda falsa aos olhos dos peritos
Há um lado quixotesco
Que faz os ventos ganharem força física
Quando resolvem pedalar os moinhos


Há um lado em mim que ressuscita
Sem precisar que eu morra
Viver me faz aprendiz
das horas lentas


* Marcos Fabrício