República do Pensamento

ESCURA ENCRUZILHADA


cronicamente inviável
amostra clínica ambulante
perturbado pelas grades das normas
louco para viver no mundo da lua onde tem mais calor humano
tem algo de fajuto no mundo das corujas
amores incondicionais exigem mil condições
interditado para seguir o que fareja o seu próprio nariz
o sujeito se debate no combate de eros com psique

quem segue demais a cabeça dos outros
costuma aposentar a própria mente
coração com teia de aranha
arranha, arranha e como dói
só as pétalas de mal me quer
na beira do caixão
morto vivo uso a cruz como enxada
para plantar sementes de libertação
jururu sem flor de lis
sou sertão sem veredas
no brejo das almas familiares
o cardápio de todo santo dia
é engolir sapos
pois princípe encantado só existe em contos de fadas
puxão de orelha primeiro
cafuné depois
na batida do buteco fui segurar meu tamborim
meu coração ia dar um troço
quando bebi a luz do fim do túnel
virei um vagão do trem da felicidade
sou josé fogo de maria fumaça
farejo legião de pinóquios a léguas
barro e oco para beber água de coco nas tardes de itapoã
colírio natural são as lágrimas
que encheram o oceano desumano de humanidade
minha verdade de porão
rompe as correntes da falsidade de quem controla a coroavela

salvo minha vida nadando que nem cachorro
quatro patas mais dignas do que dois pés
leio de trás para frente a bula do remédio
e me encabula a overdose de tédio
que os gurus de cartilha vêm tomando
pesco sem minhoca peixe graúdo
com o poder da mente-isca
quantas nuvens nubladas já esconderam
a luz do sol
não há lei que dê jeito neste crime
algemado redondamente enganado
trancafiado no quadrado trágico do ventre aprisionado
como pelas beiradas
gotas de chuva matam a minha sede
vou de escola em escola
aprender a lidar com as entrelinhas do bê-a-bá
minha coluna diária dá notícia do esqueleto andarilho
há tanta carne de terceira vendida como se fosse de primeira
quem faz terapia no shopping
é manequim de vitrine
acorda pra cuspir
se não morre pela saliva
abraços me salvam de assinar a minha sentença de morte
beijos me ligam na tomada da vida
para continuar na ativa
pois não quero pastar na aposentadoria dos meus sonhos
miolo mole é duro de temperar
quem come razão não sacia a fome de emoção
existe revolta

porque não tem volta
a ida sempre barrada no baile
amarga é a sensação de queimar sempre a largada
quando a intenção era apenas brincar de pega-pega
como nos tempos de criança
enchi a cara com copos vazios
o pior porre vindo de sucessivas porradas

enfrentando o claro enigma
transita a minha escura encruzilhada

* Marcos Fabrício